sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Dezembro Digital de Wilson Neto


 “ ...a gente se preocupa mais com a motocicleta do que com a viagem.” Marcelo Tas
Estou sempre escrevendo sobre a questão do suporte, que, na verdade, trata-se de uma não-questão. Mas como escrevo sempre pensando no contexto do Ceará e neste sentido encontro aqui certa antipatia em aceitar como arte o que não é exclusivamente pintura e escultura, volto a abordar esse tema. Também porque o nome (“Dezembro Digital”), da exposição que me faz escrever agora, cita explicitamente o suporte. Assim, assumo o risco de me repetir.
Todos nós sabemos que Duchamp (1887-1968) rompeu com a ditadura do suporte a partir dos seus “ready mades”. O urinol é uma ironia mordaz contra os que acreditavam (alguns acreditam ainda) que a arte só pode se materializar com tinta sobre tela ou a partir de um bloco de mármore.
A infinidade de maneiras com quê a arte contemporânea se coloca nos faz acreditar que “tudo é possível” e o que impera é, finalmente, a criatividade e o conceito. A idéia, e eu, diria também, a comunicação (uma idéia a ser desenvolvida em outro texto), intrínsecas à obra, a partir da concepção de um artista ou de vários artistas (os coletivos), é o que torna a obra relevante.
Lógico que em se tratando de mercado (quanto mais o de arte – o gosto é um fator decisivo) sempre haverá preferências. E a pintura acadêmica, por exemplo, terá seu público cativo independente da tendência do mercado. Até mesmo se pensarmos na tela sob o aspecto de objeto, e objeto histórico (além do artístico, é claro).
Na exposição “Dezembro Digital”, Wilson Neto com muita inteligência escolheu navegar entre duas margens: nem a liberdade total de suporte da arte contemporânea, nem o dogmatismo da pintura em tela. Suas obras são concebidas no computador, mas materializadas em tela (geralmente de grandes proporções). O computador é seu instrumento tal qual o pincel para o pintor ou uma câmera para o fotógrafo. Através do processamento de informações digitais, um nome complicado para computador, cria sua linguagem singular.
O que talvez pareça uma opção fácil para um artista, é na verdade: coragem e visão de futuro. Vislumbra-se uma inteligente noção sobre o mercado de arte, sobretudo o local (Ceará). Aqui, parênteses para a marchand Mariana Furlani (Mariana Furlani Arte Contemporânea), que aposta comercialmente com uma individual bem estruturada e importante, com uma proposta nova e de um artista também relativamente novo.
O argumento de que a arte digital seria uma forma fácil de produzir arte, além de conceitualmente não ter importância – quem disse que dificuldade técnica é um pré-requisito para boa arte? – e preconceituoso, sequer se aplicaria no caso de Wilson Neto. O artista em outras oportunidades mostrou trabalhos de um requinte artesanal e dificuldade de produção que remetem aos bordados do Ceará e ao estilista Lino Villaventura e à técnica do pontilhismo de Seurat (1859 – 1891).
É óbvio que, para ele, a técnica não é um problema a ser vencido. Nem tão pouco produzir arte através de uma plataforma eletrônica não requeira a sua própria técnica. Uso esse argumento, mas o fato é que para os grandes artistas, mais importante do que conhecer e praticar uma técnica, é, a partir dela ou não, criar a sua própria. Daí nascerá uma linguagem pessoal que caracterizará o artista (não mais o técnico que sabe fazer “arte”).
Digo coragem e visão porque o mercado cearense ainda é um pouco ortodoxo e mesmo algumas pinturas mais conceituais não são, muitas vezes, aceitas ou são recebidas com uma resistência que não existe em outros lugares. A exceção que confirma a regra é a maravilhosa obra de Antonio Bandeira (1922 - 1967) que teve seu trabalho reconhecido ainda em vida, mas não sem o apoio do, àquela época, recém inaugurado MAUC - Museu de Arte da UFC, através do seu reitor Antônio Martins Filho, nome importante e de respaldo na sociedade cearense.
 “Dezembro Digital” aposta num suporte que significa quase uma transição entre a consagrada pintura e a liberdade total na arte contemporânea. O que, além dos aspectos mercadológicos, tem seu significado como ponte entre o que era e o que virá.
Wilson sabe que o que importa é a consistência de sua obra como estética. Mas não nega o valor que é materializar seu conceito em um suporte que atenda a colecionadores e galerias. Neste aspecto, o fato de sua arte digital se apresentar em tela, ser tangível (um objeto, portanto), denota que ele quer administrar muito bem a tensão entre, a “Arte” e o “Mercado de Arte”.
Ao mesmo tempo em que ele concebe objetos (telas), não abre mão das infinitas possibilidades de criar que o computado oferece. O que o liga à liberdade e autonomia que arte contemporânea, de certa forma, defende.
Uma opção inteligente para um artista criativo e ousado, já seguro da qualidade e consistência de sua obra e afinado com o tão necessário “Mercado De Arte”.
 
Escrito por 
Serviço:
“Dezembro Digital”
A partir de 07de dezembro de 2011
+ 55 85 3242 2024
Fortaleza – CE, dezembro de 2011.

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